Quando a gente sonha em ser mergulhador, procura uma escola de confiança ou a indicação de alguém, se inscreve, participa das aulas teóricas e práticas de piscina, e depois fica naquela ansiedade para o check-out no mar.
No dia do nosso derradeiro e primeiro encontro com o oceano, já paramentados com todo o equipamento, seguimos as instruções que nos são dadas à risca, nos concentramos nos exercícios que temos maior dificuldade e, tudo correndo bem, saímos desse final-de-semana credenciados mergulhadores. Difícil segurar a ansiedade e sonhar quando faremos nossa primeira experiência com a carteirinha na mão.
E quando chegou a minha vez, não foi diferente. Lá estava eu, sozinha naquele barco onde todos pareciam saber exatamente o que era preciso fazer…menos eu! A primeira reação do novato é fingir entendimento, ou acabar assumindo a humilde condição de iniciante e pedir socorro para quem parece mais entendido naquela embarcação: o DM ou o Instrutor. Equipamento bem preso ao cilindro, tudo checado e em ordem! Vencida a primeira barreira, dou o passo de gigante e afundo até praticamente o fundo, de tão pesada que estou. Mas é fácil penso eu com meus lastros: é só colocar um pouquinho de ar no colete e pronto. Ops, acho que coloquei ar demais, deixa tirar um pouquinho de novo. Dou algumas pernadas…começo a subir, tiro mais um pouco do ar…me sinto pesada…dou umas pernadas e quase acerto com a nadadeira num ouriço. Melhor colocar mais um pouco de ar. Acho que vi um peixe passando por mim, mas não consegui prestar atenção de novo. Droga! É impressão minha ou estou subindo de novo!?
Se tem uma coisa que não solto de jeito nenhum, é a purga do colete, mas desconfio que devo estar me confundindo com os comandos, ou seja, devo estar tirando ao invés de colocar ar, e vice-versa. Essa seria a explicação lógica, certo? Olho para o DM que me sinaliza para mostrar o quanto de ar tenho ainda: olho o manômetro e respondo com o sinal correspondente: 80. Reparo que os demais tem 100, 110 – nossa, acho que estou respirando forte demais! Passo o mergulho em luta constante com o efeito balão de gás, pois é exatamente como me sinto, além de marcas de raspão nas nadadeiras e nas roupas – me sinto uma verdadeira assassina de corais e rezo para só ter me ralando em pedras. O segundo mergulho transcorre com um pouco mais de facilidade, mas mesmo assim, o efeito sobe e desce me acompanha de tal maneira, que começo a acreditar que mergulhar é isso mesmo.
Essa narrativa te parece familiar? Você já passou por isso? Pois não ter o controle de flutuabilidade é uma das maiores dificuldades que a grande maioria dos mergulhadores sofre no início, mesmo que poucos admitam. É tão comum que existe inclusive um curso específico na PADI para auxiliar o mergulhador a corrigir essa dificuldade, que se chama PPB “Peak Performance Buoyancy”, ou seja, Máximo Desempenho em Flutuação ou, popularmente conhecido apenas como “Curso de Flutuabilidade”. Após alguns mergulhos onde eu continuava a manter os meus altos e baixos, descobri a existência desse curso e rapidamente me inscrevi na primeira turma disponível. Foi a melhor decisão que fiz, além do curso de mergulho propriamente dito.
Pode parecer estranho, mas no curso Básico de Mergulho estamos tão concentrados em utilizar todo o equipamento e respirar debaixo d’água, que o controle de nossa própria respiração acaba ficando negligenciado. Quando eu via um recife que eu precisava subir para seguir o caminho, minha ação lógica era colocar mais ar no colete para flutuar acima dele – eu não sabia que meu próprio pulmão poderia fazer essa função, bastando inspirar e, uma vez em cima, tirar o ar do meu pulmão para descer. Claro que, como a minha opção era inflar o colete para fazer a operação, uma vez lá em cima eu acabava ficando mais leve ainda e, dependendo da profundidade, começaria a subir. No desespero, esvaziaria muito o colete e ficaria pesada demais, colocando de novo em rotação o processo “balão de gás”. Outro erro comum é ter medo de não conseguir afundar e assim, colocar mais lastro do que o necessário para o nosso peso e roupa de exposição, o que acaba transformando o mergulho numa operação muito cansativa, que consumirá ainda mais gás.
O curso de Flutuabilidade é muito interessante, porque abre o leque de alternativas que você tem que levar em consideração, até mesmo antes de entrar na água. É uma observação a respeito do equipamento que você está utilizando, o tipo de roupa, a profundidade do local. Mas o curso vai muito além da parte teórica – o treinamento em piscina é primordial para colocar em prática e com tranquilidade, todas as dicas que você recebeu em sala de aula. Se você quiser ir mais além, pode optar por fazer o check-out em mar, que são 2 mergulhos. Não existe nada melhor do que ter um instrutor dedicado e atento aos seus movimentos, corrigindo postura, controle de respiração, entre outras técnicas.
Saí do curso literalmente flutuando, mas dessa vez, no bom sentido. Tudo que aprendi foi colocando em prática, e meus mergulhos foram de 10 a 200. Quando via uma elevação maior no meu percurso do mergulho, inflava o pulmão e, maravilhada, via que eu subia com facilidade, assim como descia na sequência – isso sem colocar a mão no colete! Após um tempo, consegui um maior controle para chegar próximo ao fundo sem levantar sedimentos e conseguir observar aqueles seres que ficam entocados nas entranhas das tocas. Hoje sempre falo – mergulhar é muito mais do que observar os peixes que passam ao seu redor: é procurar vida nos lugares mais improváveis.
O passo seguinte foi ainda mais maravilhoso: foto sub! Eu jamais pensei na vida que iria flutuar, mirar e tirar foto – não tem coisa que prove o melhor controle de flutuabilidade do que isso.
Então, se você ainda está no primeiro patamar, sendo um balão de gás no sobe e desce, se inscreva o quanto antes no curso de PPB, e mude a configuração de seus mergulhos para melhor. Agora, se você é aquele que apenas observa e critica o mergulhador que não tem uma boa flutuabilidade, oriente-o a respeito do curso e o incentive a crescer. Ele com certeza irá te agradecer depois.
10 comentários em “Controle de Flutuabilidade”
Perfeito, dei várias risadas, me lembrando dos meus mergulhos, e só ver uma vida interessante e o próximo momento é estar de cara para o Sol…kkkkk, achou um Coral…sobe….a briga não termina…kkkk
O Curso de Flutuabilidade é fantástico, fiz recentemente na AbudDive,é chegou a hora do check-out.
Já me sinto bem mais preparado e pode ter certeza que voltarei para relatar os resultados.
Hahahaha…viu só? A intenção era essa mesma: abordar o tema, mas de forma leve e divertida – mas com a positividade de que tem como melhorar. E claro, você está no caminho. Parabéns!
Me identifiquei pra caramba com essa história, mas só no comecinho! O Abud pegou pesado (mentira, mas ele foi bem exigente) e rapidinho já comecei a pegar o jeito 🙂
É André, nem todos tem Curso Básico com o Abud hahaha…
Realmente os primeiros mergulhos são complicados para controlar a flutuabilidade, mas uma coisa que percebi é que sem o próprio equipamento é muito complicado melhorar sem demandar uma grande quantidade de mergulhos, pois sempre é um BCD novo, um regulador que não para na boca por ser pesado, ou a mangueira está longa ou curta etc etc.
Muito bom o texto parabéns.
Realmente ter o seu próprio equipamento ajuda bastante: eu já aluguei até regulador cujo bocal estava completamente rasgado. Mas a consciência corporal, a tranquilidade, a respiração, são fatores muito importantes também. Obrigada pelo elogio!!!
Eu me identifiquei, ainda tenho muita dificuldade na flutuação. Excelente texto!
Simone, eu não sabia que vc ainda sofria com isso. Vamos fazer o curso? A parte teórica on-line já resolve boa parte da charada!
Também ainda sinto dificuldades, dupla.
Mas tenho melhorado bastante após o curso avançado. Trabalhei bastante isso.
Hugo e Simone, mergulhar em Recife é um baita desafio – na entrada e saída do mar! Se vocês passam por essa batalha com facilidade, acertar a flutuabilidade será tarefa simples. Se precisarem de nossa ajuda, podem contar!